Propina a Presidente da Eletronuclear foi de R$ 4,5 milhões, diz Procuradoria
Ricardo Borges/Folhapress | ||
Policiais federais cumprem mandado de busca e apreensão na sede da Eletrobras, no centro do Rio |
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O presidente licenciado da Eletronuclear, o almirante reformado Othon Luiz Pinheiro da Silva, recebeu R$ 4,5 milhões em propina, de acordo com investigação do Ministério Público Federal que deflagrou nova fase da Operação Lava Jato com foco na corrupção na obra da usina nuclear de Angra 3.Othon, afastado do comando da estatal desde abril,foi preso na manhã desta terça-feira (28) em sua residência, no Rio, em nova fase da Lava Jato.
Os pagamentos, diz a investigação, foram efetuados entre 2009 e 2014, por meio da Aratec Engenharia, uma empresa em nome do almirante Othon, que recebeu de prestadoras de serviço das empreiteiras que tocam a obra de Angra 3.
Os pagamentos ao ex-presidente da Eletronuclear envolvem novos intermediários do pagamento de propina, segundo o Ministério Público Federal.
Quatro empresas de fachada, de acordo com a PF, funcionavam como operadoras do esquema, repassando valores à empresa Aratec, de propriedade do ex-presidente da estatal. São elas: CG Consultoria, JNobre Engenharia e Consultoria, Link Projetos e Participações e Deustchebras Comercial e Engenharia, todas são sediadas no Brasil.
"No caso mais claro, foi constatado que a empresa CG Consultoria recebeu entre 2009 e 2012 R$ 2.930.000,00 da Construtura Andrade Gutierrez e transferiu, entre 2009 a 2014, R$ 2.699.730,00 para a Aratec. A CG Consultoria não tem qualquer empregado e na prática, descontados os custos tributários, repassou o recebido pela Andrade Gutierrez à Aratec, empresa controlada por Othon Luiz", escreveu o juiz Sergio Moro no despacho que autorizou a prisão do presidente afastado da Eletronuclear.
Inicialmente, a Procuradoria havia pedido a prisão preventiva de Othon Luiz e do executivo da Andrade Gutierrez Flávio Barra. Moro concedeu somente a prisão temporária (cinco dias renováveis por igual período) de ambos.
"Pode parecer um valor pequeno, mas é um primeiro passo da investigação na área de energia", disse o delegado Igor Romário de Paula sobre a propina de R$ 4,5 milhões. "Tem muito ainda a ser apurado."
O procurador Athayde Ribeiro Costa, um dos integrantes da força-tarefa da Operação Lava Jato, afirmou que a repetição no sistema elétrico do esquema de fraude em licitação e pagamento de propina detectado na Petrobras mostra "metástase da corrupção" no país.
Os mandados de busca desta terça (28), por exemplo, atingem outras quatro empreiteiras que têm contratos com a Eletronuclear: Techint, MPE, Odebrecht e Queiroz Galvão, além de Andrade Gutierrez e Engevix.
A expectativa da força-tarefa é que esses mandados tragam novos elementos à investigação, ampliando a apuração dos desvios na área de energia.
No caso dos mandados de condução coercitiva, prestam depoimento os executivos Renato Ribeiro Abreu (MPE), Fabio Gandolfo (Odebrecht), Petrônio Braz Junior (Queiroz Galvão), Ricardo Marques (Techint) e Clóvis Numa Peixoto, (Andrade Gutierrez).
Os valores movimentados nessas transações financeiras, diz o delegado Paula, são "completamente incompatíveis" com as atividades registradas pelas companhias.
Os pagamentos ocorreram entre 2009 e 2014, de acordo com as investigações, e se referem a pelo menos seis contratos da Andrade e Engevix com a Eletronuclear. Outros contratos devem ser alvo das investigações em breve.
Em entrevista coletiva na manhã desta terça, o procurador Costa disse que o pagamento de propinas continuou a ocorrer mesmo após a prisão dos primeiros executivos no âmbito da Operação Lava Jato. "A corrupção no Brasil é endêmica e está em processo de metástase", disse.
Uma das notas da Aratec foi emitida em dezembro de 2014, seis meses após o início das investigações da Lava Jato.
O executivo Flávio Barra, da Andrade Gutierrez, foi apontado pelo delator Dalton Avancini, da Camargo Corrêa, como o responsável por intermediar o pagamento de propina na AG Energia –braço da Andrade para o setor.
Em nota, a construtora disse que "sempre esteve à disposição da Justiça" (leia mais abaixo).
Responsável por representar a empresa no consórcio de Angra 3, Barra também foi preso nesta terça, quando descia de um táxi, no Rio, em frente à sede da AG Energia. Ele estava hospedado em um flat no Leblon, de onde seguiu ainda cedo para a empresa, sem ter notícias da operação.
Segundo os policiais, Barra se entregou sem resistências e colaborou no cumprimento do mandado de busca em sua sala na companhia.
No despacho, Moro afirma que, apesar de Othon Luiz ser oficial reformado da Marinha, as provas indicam a existência de possíveis crimes de corrupção em período posterior à passagem dele para reserva (1994) e no exercício de atividade meramente civil. Segundo o juiz, o objeto da investigação não tem qualquer relação com fatos que digam respeito à jurisdição da justiça militar.
RADIOATIVIDADE
O foco das investigações desta nova fase da Lava Jato são contratos firmados por empresas com a Eletronuclear, as obras da usina nuclear Angra 3 e pagamentos de propina a funcionários da estatal.
O foco sobre Angra 3 começou com o depoimento do delator Dalton Avancini.
Iniciada em 2009, Angra 3 deveria ter entrado em operação este ano, mas a usina, a terceira planta de geração nuclear do país, está prevista para começar a produzir energia apenas em maio de 2018. O custo da obra mais que dobrou em seis anos: prevista inicialmente para custar R$ 7 bilhões, a obra é orçada atualmente em R$ 15 bilhões.
Os agentes cumpriram 30 mandados judiciais, sendo dois de prisão temporária e cinco de condução coercitiva. Eles acontecem em Brasília, São Paulo, Rio de Janeiro, Niterói e Barueri.
Editoria de Arte/Folhapress |
Outro alvo da operação foi o escritório do engenheiro Marques, diretor da Techint Engenharia e Construção, uma das empresas beneficiadas na licitação da usina Angra 3.
Há cerca de dois meses, ele declarou à Polícia Federal que se reuniu em 2010 com Wilson Carlos Cordeiro da Silva Carvalho, assessor financeiro do então governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral (PMDB-RJ) –que se candidatou à reeleição naquele ano– e com o diretor de Abastecimento da Petrobras à época, Paulo Roberto Costa. Segundo Marques, eles pediram recursos para a campanha de Cabral.
O engenheiro foi ouvido na Polícia Federal em maio pelo delegado Milton Fornazari, que está à frente do inquérito do Superior Tribunal de Justiça que investiga o envolvimento de Cabral e de seu sucessor, o atual governador Luiz Fernando Pezão (PMDB-RJ) no escândalo do Petrolão.
A Eletrobras tem papéis na Bolsa de Nova York, onde é obrigada a prestar informações detalhadas de suas contas. Em abril, a estatal anunciou que não publicaria seu balanço nos EUA devido ao envolvimento na Lava Jato. Isso causou uma perda nas ações da companhia, o que levou investidores a preparar um processo contra a empresa.
O atraso na divulgação dos números se deve à necessidade de uma auditoria interna após o depoimento à Justiça do ex-presidente da Camargo Corrêa Dalton Avancini.
O ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa também sustenta que, a exemplo do que ocorria na Petrobras, empresas privadas também formaram cartéis para atuar em outras áreas do governo: "Eletrobras, construção de hidrelétricas, portos e aeroportos", elencou, em delação premiada, reafirmando o que já havia dito à CPI da Petrobras.
A Eletrobras percorre agora o mesmo caminho da Petrobras, pivô do esquema investigado pela Lava Jato. A Petrobras demorou cinco meses para publicar seu balanço nos EUA, até que uma auditoria interna chegasse ao valor de perdas sofridas com a corrupção (R$ 6,3 bilhões).
Desde o final do ano passado, a Petrobras foi alvo de cinco ações coletivas de indenização nos Estados Unidos (mais tarde unificadas), além de ações individuais de fundos de investimento.
OUTRO LADO
Procurada, a Eletronuclear informou que só a Eletrobras falaria sobre o assunto. A estatal, por sua vez, disse que, por ora, não vai se manifestar.
A Marinha informou que Othon Luiz Pinheiro da Silva é reformado e foi licenciado do serviço ativo em 1994.
Defensor de Othon, o advogado Helton Pinto disse que ainda não pode comentar o caso, mas informou que vai a Curitiba com seu cliente.
Em nota na manhã desta terça, a Andrade Gutierrez afirmou que "sempre esteve à disposição da Justiça". A construtora só vai se pronunciar após seus advogados analisarem os termos da ação da Polícia Federal.
A Engevix, outra empreiteira citada nas investigações, ainda não se manifestou.
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